Sempre achei que aquilo que é culturalmente sentido como normal dentro da vida social, pode ser terrivelmente maléfico para a liberdade. Quando escutei da boca de um cidadão que “é melhor eleger um ladrão trabalhador do que um sujeito metido a honesto e que não faz nada!”, eu não me estarreci nem me escandalizei. Já ouvi muito coisas desse gênero. A bem da verdade, há excessiva presença de ‘sortilégios’ e de ‘azar’ nos arquétipos populares, e nas crises de consciência que às vezes vivemos.
Os conteúdos midiáticos e simbólicos que retratam a relativa tranquilidade da maioria interessada em nossos votos, não representam exatamente o seu perfil real deles. Toda essa espetacular maneira de se posicionarem como homens e mulheres decorosos, esforçados e leais ao povo, são apenas – como diria Chesterfield – ardis de políticos que não conhecem nem o ódio, nem o amor, e que são conduzidos meramente pelo interesse e não pelo sentimento.
Há quem defenda a tese pessimista de que ‘o voto não tem o poder esperado’ de nos afastar dos perigos e da má-sorte das escolhas equivocadas. Schopenhauer, a esse respeito, defendeu a ideia de que o homem não é um ser unificado e racional, porque age conforme os interesses, e é um ser fragmentado e passional, que age influenciado por forças que fogem de seu controle.
Subjugar-se politicamente é ‘cultural’. Render-se a retóricas funestas é ‘cultural’. Prostrar-se aos sofismas é cultural… Todas essas coisas são espadas nefastas que rasgam o espírito da boa-sorte. São fogos de azar social, como os riscos ilusórios que há nos olhos espiadores do anum, pássaro escuro que espreita os imprudentes. Nossos arquétipos nos entregam, e depõem contra nós, porque exprimem a ideia cultural de agentes agressores da Democracia.